O Problema da (in)constitucionalidade do Exame de Ordem
Por Karla Araujo
O índice de reprovação no Exame de Ordem da OAB é enorme. Na última
edição, apenas 14,83% dos inscritos conseguiram aprovação. Apesar de o número ser
maior que o do ano passado, que foi de 9,74%, ainda é uma minoria que consegue fazer
parte da Ordem dos Advogados do Brasil. Os bacharéis em direito dizem que o exame é
inconstitucional, pois fere o direito fundamental ao trabalho, garantindo pela
Constituição. Os que defendem o exame afirmam que ele é uma forma de proteger a
população dos maus profissionais. Henrique Tibúrcio, presidente da OAB – Goiás fala
nessa entrevista sobre a constitucionalidade do Exame de Ordem. Ele mostra os
argumentos dos que são a favor, explica os objetivos da prova e faz declarações sobre
as conseqüências que o fim do exame iria trazer para a sociedade.
Como funciona o Exame de Ordem e qual o objetivo dele?
Henrique Tiburcio - O Exame de Ordem é algo que está previsto na lei, 8906, porque
compete a OAB fazer a seleção de seus inscritos. Essa seleção se da através de um
exame de habilitação profissional que busca medir o conhecimento mínimo daquele
candidato para o exercício da advocacia. A faculdade não forma advogados, ela
forma bacharéis em direito. Se ele quer ser advogado, ele tem que se submeter a uma
demonstração de seus conhecimentos, para que seja deferida a inscrição na Ordem. O
exame busca exatamente isso: avaliar se o bacharel tem o mínimo de conhecimento para
oferecer seus serviços no mercado.
Algumas universidades estão muito mais preocupadas em preparar o aluno para o
exame do que para o trabalho jurídico. Essa é a opinião de alguns professores do
curso de direito. Como o senhor avalia essa afirmação?
Henrique Tiburcio - O Exame de Ordem analisa o conhecimento jurídico. Há
deficiência em muitas faculdades desse ensino em si. Ninguém faz faculdade de
advocacia, você faz faculdade de direito. Você se forma um bacharel em direito que
pode atuar em várias áreas. Mas para ser juiz ou promotor tem que fazer um concurso e
para ser advogado tem que passar pelo Exame de Ordem. Algumas faculdades podem
estar fazendo isso, mas aquela que fizer um trabalho sério de ensinar o seu aluno o
direito, como ele deve ser ensinado, não vai ter dificuldades em aprová-los no exame.
Aliás, a partir no ano que vem, vão ser exigidas, também, matérias do eixo fundamental
do curso, como filosofia e sociologia. Talvez os alunos dessas universidades passem na
prova, mas daí para ser um bom advogado vai uma distância muito grande.
Então já existe uma proposta de reestruturação para atender às reclamações dos que
são contra o exame?
Henrique Tiburcio - O Exame está sempre sendo melhorado. Sugestões são aceitas
e bem vindas. Ele busca sempre se aproximar ao máximo do que o aluno que sai de
uma faculdade vai encontrar no seu dia a dia profissional. O Exame está cada vez mais
deixando de ser uma analise teórica do conteúdo que se aprende na faculdade ou que se
encontra nos livros. É claro que no universo de tantas questões pode haver alguma que
a OAB repute e que poderia ter sido mais bem elaborada ou exige um conhecimento
muito profundo de determinado assunto que, muitas vezes, não faz sentido. Mas essa é a
minoria desses casos.
Qual a opinião do senhor sobre a constitucionalidade do Exame?
Henrique Tiburcio - O Exame é constitucional. A constituição é muito clara quando
diz que é livre o exercício profissional, e é nesse ponto que se apegam aqueles que são
contra o exame. Eles dizem que a OAB estaria impedindo o exercício profissional, e não
está. A lei nº 8906 prevê como uma das formas para se exercer advocacia esse exame.
Outras profissões já estão buscando adequação da lei para também exigir uma prova
de habilitação. Hoje, o ingresso na faculdade ficou muito fácil e isso gerou uma massa
de pessoas que não consegue se preparar adequadamente no período da faculdade e
que depois ficam à margem do processo querendo ser advogado, mas sem conseguir.
O exame também tem a característica de fazer com que as faculdades busquem o
aprimoramento do ensino jurídico, para que os alunos sejam profissionais competentes.
Segundo o Movimento Nacional de Bacharéis em Direito, a correção da segunda
fase é feita de acordo com o resultado da primeira. Ou seja, existe uma quantidade de
vagas para passar no exame. Como o senhor vê essa acusação?
Henrique Tiburcio - Eu não vejo muita responsabilidade ao fazer esse tipo de
declaração. Isso é mais um discurso, talvez, para colocar a opinião pública contra o
exame. A população apoia o exame, pois as pessoas se sentem protegida por ele. O que
eu não tenho visto nesses movimentos de bacharéis em direito que não conseguem ser
aprovados e engrossam essas fileiras de gente que é contra o Exame são manifestações
contra o ensino que é dado nas faculdades. Eles se insurgem contra o exame, ou seja, se
você pedir mais da faculdade, você vai ter que estudar. E o que eles querem é só tirar o
obstáculo que dificulta o acesso a uma profissão. Eu não levo isso nada a sério.
Qual seria a conseqüência do fim do exame?
Henrique Tiburcio - Se nós acabássemos com o Exame de Ordem, a OAB teria um
resultado financeiro muito melhor, porque a quantidade de pessoas que se inscreveriam
na ordem seria muito maior do que a de hoje. Nós temos hoje 700 mil advogados em
todo o país. Nós saltaríamos da noite para o dia para algo em torno de dois milhões e
meio de advogados. O impacto financeiro em um primeiro momento seria muito bom,
mas esse não é nosso objetivo. A conseqüência direta seria um prejuízo enorme para a
população, porque a qualidade dos serviços que seriam oferecidos cairia muito. O poder
legislativo vendo o problema que os profissionais sem preparo causam, iriam pensar em
leis que dispensassem o advogado as sua importância.
O senhor fez o exame? Quando?
Henrique Tiburcio - Não, não fiz. Na época não se exigia o exame porque eu fiz parte
de uma das últimas turmas que fizeram o estágio supervisionado, que era uma forma
de avaliar o estudante. Quem fizesse esse estágio e tivesse aprovação, se inscreveria na
Ordem. Mas na época nós tínhamos três universidades no estado de Goiás, era possível
avaliar de perto. Com a quantidade de faculdade que temos hoje, é impossível fazer esse
estágio supervisionado com todos. Hoje há faculdade para todas as pessoas que queiram
fazer direito. Antes nós passávamos por filtros muito mais rigorosos do que é hoje o
próprio Exame de Ordem. E digo mais: aquele aluno que fez um bom curso de direito
não tem dificuldade de passar no Exame de Ordem.
Source: Facomb